«Crise está para a democracia como a guerra para
o Estado Novo» Medina Carreira não tem dúvidas: nem na grande
crise dos anos 30 estávamos tão mal como agora.
«Estamos mais ou menos como estávamos no final da
Monarquia»
Medina Carreira considera que a crise económica
actual vai ter um grande peso nas gerações futuras.
No encerramento do 7º ciclo de debates do Clube dos
Pensadores, em Gaia, realizado na segunda-feira à
noite, o ministro das Finanças do I Governo
Constitucional revelou estar pessimista quanto à
recuperação da crise financeira em Portugal.
«A crise económica está para a democracia como as
guerras de África para o Estado Novo». O impacto da
crise, para Medina Carreira, abrange um perímetro
mais alargado «porque não temos uma crise, temos
várias».
Para além da crise económica, o economista acredita
estarmos perante «uma crise moral da elite
financeira» e uma «crise social que resulta do
desemprego e da insegurança como consequência»;
«como nunca se sabe quem é o responsável todos levam
por tabela».
Numa «economia que quase não cresce» e onde a
«capacidade geral de riqueza estagnou», o
«desemprego é altamente preocupante»: «Estamos mais
ou menos como estávamos no final da Monarquia».
Medina Carreira acrescenta que mesmo «entre os anos
30 a 40, altura da grande crise económica, estávamos
melhores do que agora».
Apesar de garantir que «a crise cá dentro já existia
antes de chegar a de lá de fora», certo é que quando
a crise internacional acabar «seremos postos à prova
de uma forma dramática». Medina Carreira explica:
«Quando se resolver lá fora, resolve-se cá, mas os
estragos do passado ficam».
O motivo do pessimismo prende-se com o facto de no
momento «a produtividade ser baixa», por «sermos
pouco competitivos» e por «termos salários baixos,
resultado da baixa produção».
Ao contrário dos anos 60 «quando beneficiávamos de
mão de obra barata», nos dias de hoje o «empresário
inteligente vai para o Leste» porque «quem investe
faz contas» e, neste momento, Portugal é um país
pouco atractivo para a abertura de empresas
estrangeiras que procuram lugares periféricos na
busca de maior margem de lucro, recorrendo a
mão-de-obra não qualificada.
Com desta estratégia, recorda, «nos anos 60,
suportamos a guerra em África sem dívida».
«Gastar dinheiro em autoestradas é o mesmo que
gastar em Magalhães: não serve para nada»
O fiscalista considera que a entrada do euro tirou a
Portugal poder de decisão no equilíbrio da economia
nacional e explicou que «quando desvalorizávamos o
escudo ganhávamos». Com o euro estes ajustes já não
são possíveis e a dívida pública aumentou cerca de
35 milhões de euros por dia nos últimos dez anos.
No sentido de incentivar o crescimento económico
desaconselha o investimento na construção de obras
como autoestradas para abrir oportunidades de
emprego e consequente aumento do consumo.
Medina Carreira acredita que «gastar dinheiro em
autoestradas é a mesma coisa que gastar dinheiro em
Playstations ou em Magalhães, não serve para nada».
«Quando acabarmos estas obras somos o quinto ou
sexto país com mais autoestradas no mundo»,
garantiu; teremos quase tantas como um país muito
maior como é a Alemanha.
Futuro da economia
Medina Carreira teme o aumento de «desemprego,
desigualdades, insegurança» e «mais estragos que se
vão juntar aos já existentes». Num futuro próximo
«podemos vir a ter juros mais altos ou ver os
empréstimos cada vez mais racionados». Mas a maior
preocupação é o facto de «os impostos poderem ser
todos comidos pela segurança social. Será aqui que
tudo se vai complicar».
«Vamos passar por um período de incerteza muito
grande», advertiu ainda o antigo ministro das
Finanças, num país onde os «Governos não são maus
pais, são padrastos», são necessários «partidos
novos a fazer coisas diferentes e «são precisos
políticos diferentes capazes de controlarem a
despesa pública».