Novo imposto de circulação surpreende milhares de
antigos proprietários de veículos Sofia Rodrigues
Muitos dos antigos donos dos veículos têm de perder
horas a cancelar a matrícula, outros não conseguem
provar a quem venderam ou que o carro foi para a
sucata
José ficou estupefacto quando soube agora que tinha
de pagar "40 e tal euros" por um carro que vendeu há
18 anos. Não sabia que o automóvel ainda estava em
seu nome e descobriu que a empresa do stand a quem
vendeu já nem existe. Agora tem de perder tempo a
cancelar a matrícula. Esteve desde as 10h30 nas
instalações da antiga Direcção-Geral de Viação, em
Lisboa, e tinha uma previsão de ser atendido às duas
da tarde. "Uma vergonha", diz José, que só quis
revelar o seu primeiro nome.
A situação deste automobilista está a ser vivida por
centenas de milhares de outros, desde que entrou em
vigor este ano o novo Imposto Único de Circulação (IUC).
O imposto deixou de ser cobrado pela circulação e
passou a sê-lo pela propriedade. Só que a base de
dados do registo automóvel está muito
desactualizada: muitos dos compradores nunca
chegaram a declarar a compra do veículo porque
custava dinheiro (63 euros) e implicava mais um
registo no processo. Ou seja, a viatura ficava em
nome do vendedor, sem que este se apercebesse.
Para cobrar o novo imposto, as Finanças acedem agora
à base de dados dos registos, o que tem levado a que
muitos automobilistas sejam confrontados com um
imposto para pagar relativo a carros que venderam há
anos.
Para minorar esta situação, o Governo criou um
regime transitório que permite regularizar os
registos não efectuados. Até ao final deste ano, o
proprietário que tenha um carro em seu nome mas que
já não é seu pode fazer uma declaração nesse
sentido. Este regime transitório só se aplica a
casos de vendas anteriores a 31 de Outubro de 2005,
o que levou o Automóvel Club de Portugal (ACP) a
lançar uma petição on-line.
Confrontados com muitas queixas de sócios, o ACP
defende que esta excepção deve ser alargada até 31
de Janeiro de 2008. "Houve precipitação ao criar um
imposto - o IUC - cuja cobrança se baseia em
registos que não estão actualizados e há um ano que
o ACP vem denunciando o caos no registo automóvel
dos "usados"", lê-se no texto da petição, que
precisa de quatro mil assinaturas para que a
situação seja levada à Assembleia da República. O
ACP tem, aliás, aconselhado os antigos proprietários
a não pagarem o IUC por enquanto.
Contactado pelo PÚBLICO, o gabinete de imprensa do
Ministério das Finanças não quis acrescentar
comentários a este assunto. Quanto a dificuldades, o
ministério garante ter indicações de que o pagamento
do IUC "está a decorrer normalmente".
Basta uma simples pesquisa no Google para se
perceber que há muitas dúvidas sobre como fazer
prova de que um veículo já não pertence ao
proprietário que consta no registo automóvel. É
exigida uma declaração em que consta a identificação
do vendedor. Mas há casos de pessoas que já venderam
o carro há mais de 20 anos e que não se lembram a
quem, tendo sido obrigadas a pedir a apreensão do
veículo (que porventura já nem existe). Há ainda
casos de automóveis que foram para a sucata há mais
de dez anos, mas cujos antigos proprietários não têm
documentos. Ao ACP têm chegado relatos de pessoas
que tentam a todo o custo encontrar o carro que
venderam há anos, assumindo um papel detectivesco.