Entre os adeptos da legalização, tornou-se quase um
lugar-comum dizer que "todos somos contra o aborto".
Em alguns casos, tratar-se-á porventura de uma
convicção sincera, embora incoerente. Na maioria,
parece ser apenas uma operação de marketing não
demasiado convincente, uma vez que esse discurso de
moderação disfarça mal a crueza da mensagem.
Por que é que somos (e devemos ser) contra o aborto?
Do meu ponto de vista, porque o aborto (legal ou
clandestino) é um mal. Porque impõe sem condições o
sacrifício da vida pré-natal, sendo que a vida
humana é o bem jurídico mais valioso em qualquer
ordem política. E porque o aborto voluntário (legal
ou clandestino) tem um efeito destrutor na própria
mulher e mãe: é uma violência física e psicológica,
que humilha, agride e dilacera a mulher no nível
mais profundo da sua feminilidade e da sua dignidade
pessoal. Ao atentar contra o próprio filho não
nascido, a mãe fere-se a si mesma.
É por isso que votamos "não". Por um lado, o aborto
livre até às 10 semanas consagra o poder arbitrário
da mãe sobre a vida do seu filho nascituro,
configurando um direito absoluto de disposição sobre
um ser humano, o que é inaceitável. O Estado não
pode deixar de proteger essa vida, a que corresponde
o mais primordial dos direitos. Por outro lado, a
liberalização multiplicaria o número de abortos,
alastrando o sofrimento e o ultraje da mulher.
Ao contrário, no discurso recente dos activistas do
"sim" não se vislumbram as razões pelas quais o
aborto seja um mal que devamos evitar: o embrião ou
o feto voltam a ser degradados à condição de um
"anexo" da mulher grávida, sem dignidade própria e
valor intrínseco; o aborto legal é proclamado
"seguro", e as respectivas sequelas físicas e
psicológicas seriam lérias e demagogia dos
partidários do "não". Tudo indica, portanto, que
para os promotores da liberalização o aborto é um
"bem": liberta a mulher de um incómodo "monte de
células" e permite-lhe "desenvolver livremente o seu
projecto de vida", sem ter que dar explicações a
ninguém. E é safe: nem riscos, nem traumas. Daí, a
sua reclamação do direito ao aborto - que é, no
fundo, o que está em causa neste referendo.
Aliás, se "todos somos contra o aborto" e queremos
evitá-lo, qual o sentido de o oferecer como se fosse
um serviço de saúde? A ideia peregrina de que a
liberalização, em si mesma, pode reduzir o número de
abortos não tem qualquer lógica, senso ou razão. O
sinal emitido para a sociedade da legalização do
aborto não poderia ser senão o da sua "bondade". E
só poderíamos esperar - como sucedeu noutros países
- um efeito de escalada: uma progressiva
insensibilização relativamente ao valor da vida, uma
gradual trivialização do aborto, um alargamento dos
prazos e dos fundamentos da sua licitude. Uma vez
aberta a porta - do aborto "porque sim" até às 10
semanas - não há nenhum argumento consistente para
parar aqui.
De facto, para as hostes do "sim", o aborto em si
mesmo não é mal nenhum - pelo contrário, já que o
convertem em objecto de um direito da mãe - desde
que não seja clandestino. Se quisessem
verdadeiramente combater o aborto (e também a
clandestinidade), não pretenderiam desviar recursos
públicos - que são sempre escassos - do apoio à
maternidade para a sua promoção legal. Querem, sim,
um aborto asséptico, organizado, gratuito e
garantido, eficiente, burocrático, banal. A
banalidade do mal.
E seriam duas as vítimas: os filhos não nascidos,
silenciosamente liquidados em clínicas "seguras", às
mãos de zelosos médicos pró-escolha ("todos contra o
aborto"...); e as mulheres e mães, atiradas para o
aborto legal, humilhadas e sozinhas - sem o amparo
da lei - perante a pressão infame do namorado, dos
pais ou do patrão, do desemprego ou da rejeição, e
sem verdadeira "opção".
É isto que nos querem oferecer? Nem pensem...
merecemos melhor!
Por isso vou votar "não"! Associação Mulheres em
Acção