Perseguidos por um crucifixo
Henrique
Monteiro
«Gente assim
torna-se perigosa. Pode, até, em última
instância, dar esmola aos pobres.»
Lisboa, 30/11/2005
Exma. Senhora Ministra da Educação
Uma das coisas que mais sentido veio dar à minha
vida foi a proposta que lhe fizeram no sentido
de retirar os crucifixos das escolas. Há muito
que os crucifixos me perseguem de modo
impiedoso, por vezes com certa brutalidade. Meu
Deus! E o que eu tive de ouvir dos crucifixos,
que se juntavam aos magotes para dizer mal de
mim, sempre que eu falhava um golo na equipa do
colégio? E o que eles faziam para eu ter más
notas? E o que eles contribuíram para eu nunca
ter chegado a Catedrático ou a outra coisa
qualquer neste país?
O crucifixo é uma arma terrível. Só mesmo nos
Estados Unidos, onde toda a gente tem uma
pistola ou uma espingarda, se pode considerar
normal que haja crucifixos nas escolas públicas!
O crucifixo é uma barbaridade e - ainda por
cima, ao que parece - um símbolo religioso.
Na verdade, eu além de ser contra os
crucifixos sou contra os símbolos religiosos.
Talvez até seja mais contra os símbolos
religiosos do que contra os crucifixos. Também
não posso com estrelas de seis pontas,
determinadas fases da lua e alguns búzios que me
recordam vagamente a lenda de Iemanjá. Odeio os
tipos gordos como um Buda ou aquelas estatuetas
de seis braços dos hindus. E acho que tudo isso
deveria ser proibido na escola, com especial
incidência para os gordos ou toda e qualquer
pessoa com mais de dois braços.
Seria, no entanto, ingénuo pensar que os
símbolos religiosos apenas estão nas escolas.
Não é verdade! Os símbolos são como o Santana,
andam por aí. Claro que há gente que não entende
os símbolos e, por isso, eles lhes passam
despercebidos.Vendo só o óbvio, apenas querem
proibir o crucifixo na escola. Mas eu pergunto:
e os postes dos telefones, o que são senão
crucifixos ligados com fios de cobre? E as gruas
do porto e dos edifícios em construção? E as
estrelas, à noite, quando parecem ter seis
pontas e propagandeiam o sionismo? E quartos
minguantes que são a mais descarada propaganda
do islamismo? E a hora de almoço no McDonalds,
que não é mais do que um hino ao budismo? Não
serão outros tantos símbolos que devem
imediatamente ser proibidos antes que nos levem
a loucuras terríveis como gostar de um Deus, de
uma ideia divina ou de qualquer transcendência
como a vida além da morte ou a reincarnação?
Gente assim torna-se perigosa. Sobretudo
porque se pode sentir livre dos compromissos
terrenos e dedicar-se ao que lhe apetece. Gente
assim pode, em última instância, ir para um
confim do mundo ajudar os miseráveis. Ou dar
esmola aos pobres! É gente com quem não se deve
ter contemplações.
E, depois, o crucifixo sempre me perseguiu.
Tenho a certeza que ainda hoje diz mal de mim.
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