Há poucos dias, um diário de referência anunciava
gravemente: "Casamentos católicos caem 62% em apenas
uma década" (DN/8 Out.). O texto comentava dados do
recente Anuário Católico de Portugal publicado pela
Conferência Episcopal. O artigo enganou--se nas
contas, porque a queda, sem dúvida acentuada, foi
bastante inferior: 46,7% no País e 58,6% no
Patriarcado de Lisboa. Além disso parece não se dar
conta de que compara realidades incongruentes.
A forte mudança na estrutura demográfica nestes dez
anos recomenda muitas cautelas na interpretação de
tais taxas. Uma olhadela às tendências de fundo
basta para reforçar esses cuidados. Segundo o INE, a
percentagem de casamentos católicos desce
paulatinamente há 50 anos. Mas nos finais da década
de 1990 acelerou subitamente, passando de 67% do
total em 1998 para menos de 48% em 2007. Quem lida
com fenómenos demográficos sabe que movimentos
bruscos destes não se devem à evolução normal, mas a
choques específicos.
Há vários suspeitos óbvios. Não só o total de
casamentos se reduziu fortemente, caindo para metade
de 1977 a 2007 e 30% desde 1997, mas nesse período
entraram em Portugal mais de 220 mil imigrantes.
Como são em geral jovens, casadoiros e vêm de países
não católicos, isso justifica grande parte do
fenómeno.
Infelizmente o texto não evita a tentação de avançar
uma explicação, e caiu na mais simples e enganadora:
"A menor religiosidade das pessoas." Isto contraria
os resultados da Sociologia da Religião, que apontam
precisamente a tendência oposta. As pessoas não
estão a diminuir a sua religiosidade, mesmo quando
reduzem a adesão a cultos formais. Aliás o próprio
artigo se dá conta de algo estranho, ao afirmar:
"Curiosamente, noutros marcos importantes da vida
religiosa dos crentes, como baptismo, primeira
comunhão ou crisma (confirmação do baptismo), a
descida não é tão acentuada." Isto só é curioso para
quem não entende o que está a acontecer e, mais uma
vez, não nota que o número de nascimentos não é
comparável. O número de baptizados em Portugal é
estável há 25 anos, caindo a percentagem por causa
dos imigrantes.
O que é mesmo curioso é ninguém ter relacionado a
notícia citada com outro artigo próximo: "Natalidade
volta a diminuir nos primeiros nove meses deste ano"
(Público, 14/Out.). Essas estatísticas vêm do "teste
do pezinho" e o especialista citado prevê que "em
2009 o número de nados-vivos não chegue sequer aos
cem mil". Diz--se "assustado" com isto, mas deve ser
o único. Entre os responsáveis ninguém parece
perturbado com a dinâmica, que é, sem dúvida, das
mais determinantes para o nosso futuro.
Portugal, que desde 2007 tem mais mortes que
nascimentos, regista hoje uma taxa de fertilidade
bastante inferior à baixa média europeia, em clara
decadência demográfica. Se mais uma vez descontarmos
os filhos de imigrantes, vemos que estamos num dos
níveis de natalidade mais baixos do mundo. Os
portugueses são actualmente uma raça em vias de
extinção.
Perante isto, a atitude das autoridades roça a
incompetência criminosa. O Governo, que no Programa
de 2005 nem sequer citava a evolução demográfica,
seguiu nestes quatro anos uma linha política bem
clara, de agravamento da situação. Financiando
abortos, facilitando divórcios e fomentando o
casamento de homossexuais, pode dizer-se que a
política é um importante factor na promoção da
desgraça. Ela é o suspeito que falta.
Que se podia ter feito para enfrentar a questão? Em
tema tão básico e pessoal, como envolver os
ministros? Todos os nossos parceiros europeus,
embora em situações bastante menos graves, há
décadas que ensaiam estratégias. Há já larga
experiência e vasto conjunto de resultados, sucessos
e fiascos, onde se pode aprender. Claro que esses
países, coitados, não puderam gozar da maravilhosa
"modernidade" que o eng. Sócrates nos preparou.
O futuro, sofrendo as terríveis consequências,
abominará a cegueira e irresponsabilidade dos que
abandonam a realidade para se embalar em ideologias
antifamília. Sem famílias sólidas, tudo se extingue.