Fundo revê em baixa crescimento para um por cento
no próximo ano FMI garante que principais problemas da
economia portuguesa são domésticos Sérgio Aníbal
A crise internacional não é a principal causa para o
ritmo de crescimento lento que Portugal irá
continuar a apresentar durante este ano e o próximo,
alerta o Fundo Monetário Internacional (FMI).
"A deterioração do ambiente económico global está a
limitar a retoma portuguesa, mas os problemas
fundamentais da economia são domésticos: défice
externo e público elevados, endividamento muito alto
das famílias, empresas e Estado e um substancial
diferencial de competitividade", lê-se num documento
publicado ontem.
O FMI afasta, deste modo, a tese que tem vindo a ser
defendida, nomeadamente pelo Governo, de que o
abrandamento económico apenas é provocado pela
conjuntura internacional. A instituição liderada por
Dominique Strauss-Kahn aproveita até para alertar
para o perigo de considerar as condições externas
"como uma razão para recorrer a receitas fáceis".
Pelo contrário, diz o Fundo na análise preliminar a
Portugal realizada no âmbito da "consulta do artigo
IV", é necessário que "todos os sectores façam um
ajustamento e poupem mais", para que se possa
corrigir o facto de "Portugal estar a viver acima
das suas possibilidades há muitos anos". Esta
entidade, conhecida pelas suas estratégias de
austeridade orçamental e liberalização da economia,
aconselha, por isso, a "continuar a consolidação
orçamental", "garantir a saúde do sistema
financeiro" e "melhorar a competitividade".
Nova travagem em 2009
O tom da análise do FMI em relação a Portugal,
apesar de apresentar elogios ao esforço de reforma
do Governo ao nível do orçamento, lei laboral e
simplificação administrativa, tornou-se este ano
mais pessimista, incluindo mesmo uma revisão em
baixa das previsões de crescimento para o próximo
ano.
No passado mês de Abril, o FMI tinha projectado para
Portugal, um crescimento de 1,3 por cento em 2008 e
de 1,4 por cento em 2009. Na altura, o ministro das
Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, acusou o
Fundo de estar demasiado pessimista, mas a verdade é
que, mesmo assim, as previsões que tinham sido
apresentadas apontavam para um regresso de Portugal
à convergência com a Europa já em 2009, uma vez que
o crescimento estimado para a zona euro era de 1,2
por cento.
Ontem, o FMI reviu em alta as estimativas para a
zona euro, passando o crescimento em 2008 de 1,4
para 1,7 por cento e mantendo os 1,2 por cento de
2009, mas tornou as projecções para Portugal ainda
mais negativas, deixando a convergência adiada por
mais um ano. Agora, a aposta para Portugal é de um
crescimento de 1,25 por cento em 2008 (quase sem
alteração em relação à projecção anterior) e de um
novo abrandamento económico em 2009 para apenas um
por cento.
Na terça-feira, o Banco de Portugal tinha apontado
para variações do PIB de 1,3 por cento em 2008 e 1,4
por cento em 2009. O facto de o FMI estar agora mais
pessimista em relação à reacção da economia em 2009
pode ser explicado pela ideia expressa de que "a não
ser que a produtividade suba, o peso do ajustamento
vai cair sobre o consumo e o investimento".
Em relação ao sector financeiro, o Fundo deixa
também alguns aviso. Garante que "continua a estar
saudável e a ser bem supervisionado", mas alerta
para a dependência dos bancos portugueses em relação
ao financiamento externo, para a exposição ao risco
de mercado que têm através das suas participações e
fundos de pensões e para o risco de crédito
provocado pelo abrandamento económico e elevado
nível de endividamento das famílias e empresas.
Clima económico em queda
Como que a dar razão às mais recentes previsões
realizadas para a economia portuguesa, o Instituto
Nacional de Estatística revelou ontem que os sinais
de abrandamento em Portugal se acentuaram em Junho.
O indicador de clima económico, que é calculado
essencialmente com base nas expectativas dos agentes
económicos, caiu em Junho de uma variação de 0,9
para 0,5 por cento. O indicador de actividade
económica, que conta com a contribuição de
indicadores quantitativos sectoriais, abrandou em
Maio de dois para 1,4 por cento. A quebra no ritmo
de crescimento da venda de veículos automóveis,
tanto de passageiros como comerciais, é um dos
motivos para esta evolução, que ameaça os resultados
da economia portuguesa durante o segundo trimestre
deste ano.
As receitas do FMI
Orçamento
O Fundo elogia os últimos resultados conseguidos
pelo Governo na redução do défice, mas avisa que "a
consolidação orçamental tem de continuar em 2009" e
defende que "deve haver um particular cuidado em
manter o crescimento dos salários do Estado sob
controlo". Em relação a novas medidas destinadas a
limitar os danos causados pela subida dos preços das
matérias-primas e dos juros, o Fundo diz que devem
ser "direccionadas, temporárias e compensadas por
outras medidas".
Legislação laboral
O acordo entre o Governo e a maior parte dos
parceiros sociais neste capítulo é considerado como
um "passo em frente". No entanto, o Fundo queria
mais e critica em particular a subida da
contribuição para a Segurança Social exigida nos
contratos a termo. Este tipo de contratos, afirma o
FMI, "têm-se revelado críticos para criar emprego".
O relatório avisa ainda que o grande teste à futura
legislação vai ser a sua implementação, defendendo
que não se deve colocar de parte a possibilidade de,
no futuro, de acordo com os resultados, tomar novas
medidas, como o alargamento das causas de
despedimento.
Reformas
O FMI quer que o impulso reformista se mantenha,
devendo por isso "evitar-se ameaçar os mais recentes
avanços e objectivos de longo prazo por ganhos
imediatos". Para que isso aconteça, esta entidade
pede a definição de uma agenda nacional de
convergência do crescimento.