Crianças: Pode pôr o meu filho perfeito, que eu
não tenho tempo?
Sandra Moutinho
Os psicólogos tratam cada vez mais pais
"completamente desorientados", para quem educar uma
criança com um ou dois anos é missão impossível.
Procuram no consultório o filho perfeito e um
antídoto contra o remorso pela falta de tempo para
ele.
Alguns destes pais já passaram pelo consultório de
Maria Jesús Alava Reys, psicóloga espanhola que
lança agora em Portugal o livro "O não também ajuda
a crescer" e que, a esse propósito, partilhou com a
agência Lusa alguns dos casos que tem trabalhado e
que revelam um grande sofrimento de pais e filhos.
"Educar não é fácil. Apesar de hoje em dia os pais
estarem seguramente mais preocupados com a educação
dos filhos, coincidem vários aspectos sociais mais
difíceis, como a ausência de irmãos em muitas
famílias e a falta de tempo", disse a especialista,
autora de vários livros campeões de venda sobre
comportamento.
Se os filhos precisam de pais presentes, os pais
precisam de tempo para serem pais. Ambos não
encontram o que necessitam e acabam, muitas vezes,
nos consultórios dos psicólogos.
"Os consultórios dos psicólogos estão cheios de
educadores deprimidos e pais perdidos que desistiram
e que procuram, com bastante cepticismo, algo que
lhes permita encontrar um pouco de luz entre tanta
escuridão", lê-se na obra de Maria Jesús Alava Reys.
A especialista reconhece, contudo, "erros
gravíssimos" que estes profissionais têm cometido e
que estão hoje a ter repercussões muito sérias.
Os pais que seguiram a orientação defendida há anos
de que era melhor deixar as crianças fazerem tudo,
pois podiam ficar traumatizadas, estão hoje a pagar
por isso.
"Nós, psicólogos, já pedimos perdão por isso",
afirmou, lembrando que os piores casos que tem
acompanhado - e vê cerca de 500 crianças por ano –
são precisamente de filhos manipuladores e tiranos
que assim agem porque os pais não são consequentes.
Ao pais o seu papel e, para esta especialista, ele
não passa por serem amigos dos filhos.
"Os pais não têm de ser amigos dos filhos. Este é um
dos principais horrores que se cometem na educação.
Amigos há muitos, mas só temos dois pais e a criança
precisa que o pai actue, não como um amigo, mas como
um pai", disse.
Se um pai actuar como amigo, sublinhou, o filho não
o respeitará e mais tarde poderá acusar o educador
de ter falhado neste papel.
Esta psicóloga defende, por isso, mão firme na
educação dos filhos, com muitas gargalhadas à
mistura. Preconiza, essencialmente, tempo de pais.
"Não se trata de ser escravos dos filhos, pois isso
resultaria em filhos manipuladores. Não é acudir
sempre que ele chama, pois ele tem de saber esperar.
É estar com eles, nem que seja meia-hora e,
principalmente, estar presente para quando eles
necessitarem de falar e ser ouvidos", disse.
E acrescentou: "As crianças hoje têm mais coisas,
mais brinquedos, mas menos tempo dos pais, são mais
infelizes e chegam ao ponto de dizer nas consultas
que se sentem terrivelmente sós".
O mau comportamento é, muitas vezes, a solução
encontrada por estas crianças, para terem a atenção
da família.
Por seu lado, os pais assumem que não conseguem
educar uma criança com um ou dois anos, sofrendo com
tarefas como dar de comer ou pôr a dormir o filho.
"Os pais devem desfrutar da sua paternidade e saber
fazer o que têm de fazer. Nós, com a nossa
experiência, orientamo-los nesse sentido", explicou.
A especialista deixa uma única "dica": "A
insegurança transmite-se. A felicidade também".