O padre Malagrida já está em Copenhaga e o
Marquês de Pombal vai a caminho
Helena Matos
As alterações climáticas sempre aconteceram e a
instabilidade do clima sempre reduziu os homens à
sua insignificância
Nas igrejas pode estar a diminuir o número de fiéis,
mas nas ruas correm multidões de penitentes. Dizem
que vão salvar o planeta e sobretudo comprazem-se em
anunciar-lhe o fim, ora submerso como aconteceu à
orgulhosa Atlântida, ora abrasado como terá sucedido
em Sodoma e Gomorra. Àqueles que ousam questionar
tal Apocalipse acusam de incredulidade e casos
existem em que tentaram mesmo criminalizar a
formulação destas dúvidas que vêem como uma heresia.
E assim, dois séculos e meio após ter sido escrito o
Juízo da Verdadeira Causa do Terramoto Que Padeceu a
Corte de Lisboa, no primeiro de Novembro de 1755, o
padre Gabriel Malagrida tornou-se não só uma obra
actual como global.
Tudo o que neste século XXI acontece na Terra, seja
uma trovoada na Austrália ou um nevão no Canadá, é o
resultado das alterações climáticas, agora
transformadas em crime humanamente nefando no
sentido setecentista do termo. Nesse século XVIII em
que Malagrida foi pregador, o terramoto de Lisboa
foi visto como um sinal da ira divina. Cabe
perguntar por que se teria zangado Deus em 1755 com
esta cidade de Lisboa? Depende da fé dos acusadores.
Para o jesuíta Malagrida a zanga de Deus provinha
dos "intoleráveis pecados", como a vaidade,
praticados nesta cidade. Para os protestantes aquela
catástrofe nascia do desagrado divino com esta
Lisboa onde se adoravam imagens, existia a
Inquisição e se dizia missa em latim, o que, segundo
eles, impedia o conhecimento da palavra de Deus e
gerava a sua consequente fúria.
O resto desta história é razoavelmente conhecido: o
padre Malagrida acabou queimado num auto-de-fé e o
Marquês de Pombal reforçou os seus poderes. Das
fúrias de Deus com os lisboetas deixou de se falar,
até porque outras fúrias se abateram sobre o reino e
a sua capital. Entretanto descobriu-se que os nossos
antepassados, tenham sido eles os fenícios ou os
gregos, acharam por bem fundar esta cidade numa zona
de risco sísmico que nos dá os terramotos como das
raras certezas das nossas vidas alfacinhas, com
pecados ou sem eles.
Aquele espalhafato penitencial da pegada ecológica
que esta semana anda por Copenhaga tem de facto
muito dopalavreado dos pregadores que, comoo pobre
Malagrida, aterrorizavam os nossos antepassados,
associando os seus pecados aos tremores de terra, à
perda das colheitas, àssecas ou à fúria das águas.
As alterações climáticas sempre aconteceram e a
instabilidade do clima sempre reduziu os homens,
sejam eles das cavernas ou dos arranha-céus, à sua
insignificância. Por isso em todos os tempos sempre
existirão Malagridas a inventarem-nos
responsabilidades naquilo que infelizmente não
podemos evitar, como as catástrofes naturais, ou a
agigantarem-nos os medose as culpas como está a
acontecer actualmente com o aquecimento global que,
recordo, sucede aoterror duma nova idade do gelo e à
explosãodemográfica como os flagelos que, nas
últimas décadas, nos garantiram que iam destruir o
planeta.
Mas não sejamos inocentes: Malagrida não existe sem
Pombal. Por Copenhaga circulam os herdeiros do
autoritarismo iluminista que em cada catástrofe,
seja ela real ou anunciada, vêem uma possibilidade
de aumentar o seu poder para níveis que, não fosse
esta ambiência catastrófica, não se aceitariam. As
propostas que em nome da salvação do planeta se têm
feito ouvir por parte de líderes como Sarkozy, Lula
da Silva ou Zapatero provavelmente ficarão pelo meio
do caminho à excepção óbvia da produção de milhares
e milhares de regulamentos que aumentarão o poder
dos governos não para melhorar a vida do ou no
planeta, mas sim para complicar a existência dos
comuns mortais e torná-los cada vez mais dependentes
do poder político. Ensaísta O que têm em comum
Liliane Bettencourt e a duquesa de Alba? São velhas
- nasceram ambas na década de 20 do século passado -
e muito ricas. A primeira herdou o império l"Oréal e
a segunda é proprietária de um património cujo valor
é difícil de quantificar mas onde se incluem
títulos, palácios, quadros e propriedades agrícolas.
Quer uma, quer outra, com os seus mais de 80 anos,
mantêm relações de grande intimidade com homens
muito mais novos, mais ou menos desprovidos de bens
e, no caso do protegido de Liliane Bettencourt, com
um passado preenchido com situações ambíguas do
ponto de vista das dádivas que recebeu de gente
velha e rica. Indiferentes a embaraços e remoques,
ambas as mulheres resolveram manter estes
relacionamentos. A duquesa de Alba traz os filhos à
beira de um ataque de nervos com a possibilidade de
verem os Goyas da família e quem sabe o próprio
palácio sevilhano das Donas acabarem propriedade
daquele senhor com ar de empregado de um café
decadente. Quanto a Liliane Bettencourt, foi
confrontada com um processo em que a sua filha
questionava a sua capacidade mental para continuar a
gerir os seus bens. Por agora, as velhas estão a
ganhar, ou seja, a duquesa de Alba não diz que não
casa e Liliane Bettencourt viu um tribunal indeferir
as pretensões da filha. Mas o tempo corre contra
elas, não só porque são velhas, mas também porque a
mesma sociedade que tudo tolera aos jovens tem muito
claro aquilo que os velhos podem ou não fazer e
sobretudo o que não podem gastar. Quer se tenha para
gastar uma grande fortuna ou uma pensão de
sobrevivência. Muito provavelmente têm razão aqueles
que acusam Liliane Bettencourt ou a duquesa de Alba
de não estarem a gerir da melhor forma os seus bens
ou de se estarem a deixar ludibriar. Mas suponhamos
que em vez de oitenta e muitos anos as senhoras
tinham 18 e se armavam em clones da Paris Hilton.
Alguém pediria que fossem interditas por não serem
capazes de gerir os seus bens e as suas pessoas? Se
Liliane Bettencourt e a duquesa de Alba tivessem
vinte anos, podiam queimar o dinheiro que os pais
lhes deixaram que ninguém ousaria dizer que eram
parvas ou que estavam malucas. Como são velhas
exige-se-lhes que se transformem numa espécie de
tranquilas usufrutuárias dos bens dos filhos e dos
netos que felizmente para eles podem asnear à
vontade.