A raiz é o egoísmo. O fruto é a solidão. O tronco,
ramos, folhas e flores são muitos. Vários com nomes
maravilhosos: direitos humanos, liberdade
individual, realização pessoal. Envenenados pela
raiz, os grandes valores apodrecem e infectam. O
fruto é sempre a solidão.
Vimos o desejo nobre de a igualdade social acabar
nos morticínios da guilhotina jacobina; o desejo
sublime da afirmação cultural nacional cair na
chacina do holocausto nazi; a ânsia magnífica da
justiça económica descambar no horror do gulag
soviético. Quanto mais elevados os propósitos, mais
monstruosas as aberrações distorcidas pela seiva
peçonhenta da raiz soberba.
O pior de todos os ramos coube-nos em sorte. Pior
porque toca o mais íntimo do ser humano, a família.
Corrompidos os mecanismos sociais no século XVIII,
os regimes políticos no século XIX, os sistemas
económicos no século XX, hoje as entranhas egoístas
da árvore atacam a vida pessoal. Entretanto, a
humanidade já expeliu muito do veneno dos outros
ramos. Ninguém defende a sociedade sem classes, os
regimes perfeitos, a economia colectiva. Apesar dos
belos ideais, a desgraça dessas concepções egoístas
está à vista. Agora todas as forças se dirigem a
esfarrapar os laços familiares, as mais íntimas
fibras do nosso ser.
A argumentação é a mesma de jacobinos, nazis e
comunistas, aplicada à vida íntima. Pretende-se,
como então, defender a liberdade, impor a igualdade,
forçar a realização pessoal. Por baixo, como antes,
sente-se a cauda viperina do egoísmo.
O amor conjugal é valor que todos defendem. Mas,
como os direitos individuais de sucesso pessoal se
sobrepõem a tudo, tem de acabar na ruptura e
divórcio. Como o indivíduo é soberano, a família não
se pode defender dos seus caprichos. A lei, em nome
da liberdade, acode promovendo a precariedade.
Torna-se mais fácil dissolver um casamento que uma
sociedade comercial ou contrato de trabalho.
A fecundidade e felicidade das crianças é propósito
universal. Mas, como os projectos de consumo ou
carreira têm precedência, o filho transforma-se num
inimigo a abater. Em relação tão íntima a única
solução é a morte. E o Estado lá está para fornecer
abortos subsidiados. Os embriões passam de espécie
protegida a vírus de extirpar.
A natureza é valor supremo que todos apoiam
ecologicamente. Toda a natureza, menos a humana,
porque essa limita a igualdade de género. Que é a
natureza face ao império dos sentidos? Como o
capricho pessoal afinal tem mais direitos que a
realidade congénita, o Estado iguala todas as
perversões como aceitáveis e equivalentes.
O efeito comum é sempre a agressão à família. O
resultado é sempre a solidão. Como a carreira acaba
na reforma, a beleza fenece com a idade, a
vitalidade se gasta no tempo, todos acabam sós,
autónomos, fechados, contemplando uma colecção de
caprichos momentâneos, prazeres fugidios, aventuras
ocasionais, rupturas, infidelidades, traições. A
conclusão é a velhice solitária, vítima do egoísmo
que a isolou. Alguns ainda se espantam dos que
morrem anónimos: "Uma das pobrezas mais profundas
que o homem pode experimentar é a solidão. Vistas
bem as coisas, as outras pobrezas, incluindo a
material, também nascem do isolamento, de não ser
amado ou da dificuldade de amar" (Bento XVI Caritas
in Veritate 53).
Os propósitos anunciados eram grandiosos. O mal
estava na raiz egoísta, na origem interesseira, na
estrutura auto-suficiente. O mal vinha da base, das
entranhas. Que fazer a uma árvore envenenada na
estirpe? A única solução é enxertar um galho
saudável e esperar que a seiva sadia se espalhe no
organismo.
Isso foi o que aconteceu e que nós vos anunciamos.
Na Páscoa um ramo de puro amor foi pregado na árvore
da morte. Agora, além da seiva do orgulho egoísta,
circula no tronco, ramos, flores e folhas um fluxo
de divina caridade. O fruto é a união. Isso salvou a
sociedade pela subsidiariedade, a política pela
democ'racia, a economia pela solidariedade. Isso
salvará a família dos horrores com que o nosso tempo
a persegue. Só o amor vence a solidão.