Alguns conselhos de grandes mestres sobre algumas
verdades esquecidas pelo sistema educativo
Na semana em que centenas de
milhares de alunos regressam às aulas com exames à
vista, e depois de termos conhecido um relatório da
OCDE que se referia às graves debilidades da
Educação em Portugal, talvez seja útil dar a palavra
a outros para recordar algumas verdades demasiadas
vezes esquecidas.
Comecemos por George Steiner, a quem o título desde
editorial foi tomado por empréstimo. De um outro seu
livro recentemente editado em Portugal e onde, em
conversa com Célile Ladjali, debate a relação
professor-aluno, retiremos algumas reflexões.
A primeira é sobre a importância de exercitar a
memória e de decorar, dois valores em desuso numa
escola onde se tende a privilegiar apenas a
"compreensão": "Creio profundamente que quando
abandonamos a aprendizagem de cor - e a criança pode
aprender muito depressa, de modo admirável, se
negligenciarmos a memória, se não a mantivermos à
maneira do atleta que exercita os seus músculos, ela
definha. Hoje, a nossa escola é de amnésia
planificada". Amnésia que vai de se considerar
inútil tanto decorar um poema como a tabuada.
A segunda é sobre como estimular a aprendizagem: "O
horror do nosso ensino, da sua falsa realidade (...)
é minorar os sonhos da criança. (...) A grande
alegria só começa quando se diz: "Ainda não
compreendi, mas vou compreender. Ainda não sonhei,
mas vou sonhar". Ao nivelar, ao fazer uma falsa
democracia da mediocridade, mata-se na criança a
possibilidade de ultrapassar os seus limites
sociais, domésticos, pessoais e até físicos."
Steiner prossegue elogiando a atitude mais vulgar
nos Estados Unidos de dizer naturalmente a cada
criança que "vai ultrapassar os pais", um "melhorismo"
que recorda já ter sido notado por Tocqueville.
A terceira é sobre a capacidade de não abafar a
diferença e estimular os talentos. O velho professor
recorda uma história passada com o pintor Paul Klee,
aos seis anos, que, face a um exercício onde se
pedia para desenhar um aqueduto, o fez colocando
sapatos em todos os pilares. Steiner vê nesse
episódio uma "sinapse de génio" que, felizmente, o
professor não reprimiu, pelo contrário. Disse antes
aos pais que tivessem atenção, "pois algo de enorme
poderá acontecer". Aconteceu, como todos sabemos, e
algo devemos a esse professor que não esmagou a
criança "dentro de uma estrutura social de
igualitarismo", lugar onde se poderia destruir para
sempre "a possibilidade do milagre que é a grande
obra".
Talvez seja pedir de mais esperar tanto dos nossos
educadores, mas então que dizer de um pai que, há
176 anos, ao entregar o seu filho à escola primária,
pedia "apenas" ao professor: [Faça-o] aprender que
nem todos os homens são justos, nem todos são
verdadeiros, mas, por favor, diga-lhe que por cada
vilão há um herói, que por cada egoísta há também um
líder dedicado, ensine-lhe que por cada inimigo
haverá também um amigo, ensine-lhe que mais vale uma
moeda ganha que uma moeda encontrada, ensine-o a
perder, mas também a saber gozar a vitória, (...)
faça-o maravilhar-se com os livros, mas deixe-o
também perder-se com os pássaros do céu, as flores
do campo, os montes e os vales. (...) Ensine-o a
acreditar em si, mesmo se sozinho contra todos.
(...) Ensine-o a nunca entrar no comboio
simplesmente porque os outros também entraram.
Ensine-o a ouvir a todos, mas, na hora da verdade, a
decidir sozinho, ensine-o a rir quando está triste e
explique-lhe que por vezes os homens também choram.
Ensine-o a ignorar as multidões que reclamam sangue
e a lutar só contra todos, se ele achar que tem
razão"?
Pedido exigente, sem dúvida, e também ambicioso. Mas
pedido que todos os pais deviam repetir, seguindo
exemplo de quem primeiro o formulou: Abraham Lincoln.